O Retorno das Ariranhas à Paisagem Baniwa

       A ariranha (Pteroneura brasiliensis) é o maior mustelídeos existente, endêmico da América Latina. A espécie foi considerada localmente extinta em diversas áreas de distribuição histórica devido a intensa caça comercial que visava sua valiosa pele. Somente com a proibição da caça no Brasil em 1967, a espécie passou a apresentar sinais de recuperação populacional. No entanto a ariranha ainda é considerada “em perigo” pela IUCN devido às ameaças que enfrenta no processo de recolonização, incluindo a destruição do habitat, conflitos com a atividade de pesca, e a lacunas no conhecimento ecológico da espécie que dificultam a elaboração de estratégias de conservação eficientes.

      Buscando compreender como a paisagem influencia a distribuição de ariranhas, a aluna de mestrado do programa de pós-graduação em Ecologia do INPA, Natalia Camps Pimenta, regressou após 45 dias no médio Rio Içana, onde esteve investigando a recolonização dos lagos e igarapés da região pelas ariranhas. A expedição é parte do seu projeto de pesquisa intitulado “O Retorno das Ariranhas à Paisagem Baniwa”, que visa identificar fatores históricos, culturais e ambientais que estão influenciando a reocupação da região pelas ariranhas, levando em consideração a perspectiva indígena.

      A região dos lagos do médio Rio Içana está localizada na Terra Indígena do Alto Rio Negro, município de São Gabriel da Cachoeira (Amazonas), e é habitada pelo grupo indígena da etnia Baniwa. O uso frequente dos lagos e igarapés para a pesca permitiu que os Baniwa constatassem o retorno das ariranhas para a região. Tal constatação despertou o interesse da população local que, assim como a ariranha, tem o recurso pesqueiro como principal fonte alimentar.

      Visando atender a demanda da população local e preencher lacunas no conhecimento ecológico da espécie, criou-se esta pesquisa participativa com os Baniwa. Durante a pesquisa de campo realizada por pesquisadores indígenas e não indígenas, coletou-se dados sobre a ocorrência de ariranhas em lagos e igarapés da região que serão correlacionados com diversos elementos da paisagem, tais como o tipo de vegetação predominante na margem, transparência e profundidade da água, declividade de barranco, perímetro, área e forma do corpo hídrico.

      Também foram coletados dados etnoecológicos sobre a composição de peixes de cada lago/igarapé amostrado, assim como informações sobre o histórico de caça na região, a trajetória de extinção local e recolonização da área pelas ariranhas e as percepções dos Baniwa da região sobre o retorno das ariranhas para suas áreas de uso. Buscando verificar se há sobreposição de dieta e uso de habitat entre os Baniwa e as ariranhas, os entrevistados também foram questionados sobre suas preferências alimentares e sobre a preferência de lagos e igarapés para realização da atividade pesqueira.

      Os dados gerados a partir da união de conhecimento tradicional e práticas Baniwa com métodos da comunidade científica será utilizado na reestruturação do programa de manejo 'Kophe Koyanaale' (Casa de Peixe). Desta forma, busca-se contribuir para a criação de uma proposta de gestão integrada do território Baniwa. Ações de gerenciamento da região, visam regular o uso dos recursos naturais de forma sustentável garantindo a disponibilidade para futuras gerações. Assim, espera-se evitar danos ao processo de reocupação das ariranhas na área, e ao mesmo tempo, garantir a manutenção do modo de vida do povo Baniwa.

      A pesquisa está sendo realizada sob supervisão do PhD. Adrian Barnett do Grupo de Pesquisa de Mamíferos Amazônicos do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) e pelo PhD. Glenn Shepard do Departamento de Antropologia do Museu Paraense Emílio Goeldi, e em parceria com a Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (FOIRN) e da Organização Indígena da Bacia do Içana (OIBI). Conta com o apoio financeiro da instituição The Rufford Foundation e com apoio logístido da instituição Idea Wild.

 

Texto: Natalia Campos Pimenta (Grupo de Pesquisa de Mamíferos Amazônicos / INPA)